Centro de Documentação: História e Memória da Obstetrícia no Brasil
DULCE MARIA ROSA GUALDA
Possui graduação em Obstetrícia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (1969), graduação em Pedagogia pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (1968), mestrado em Enfermagem – System School Of Nursing University Of Texas At Austin (1975), doutorado em Enfermagem pela Universidade de São Paulo (1993) e Livre Docente – Escola de Enfermagem da USP (1998). Foi diretora do Departamento de Enfermagem do Hospital Universitário – HU/USP (1995-2000), Presidente do Programa Interunidades de Doutoramento em Enfermagem (2010-2012) e Chefe do Departamento ENP-EEUSP (2010-2012). Responsável pela criação e coordenadora do Curso de Obstetrícia da Escola de Artes Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (2005-2008). Atualmente é professora colaboradora Sênior do Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Psiquiátrica da Escola de Enfermagem da USP. Tem experiência na área de Enfermagem, com ênfase em Enfermagem Obstétrica, atuando principalmente com abordagem antropologica.
Os cursos de Obstetrícia já existiram no Brasil. Esses cursos foram extintos no início da década de 1970. Dulce, em sua trajetória, viu a chegada do estetoscópio de Pinard, a intensificação da medicalização do parto, o boom das cesáreas, viu o SUS nascer. Com a possibilidade da construção de um novo campus da USP na Zona Leste, vê a chance do curso de Obstetrícia retornar. Ela é uma das idealizadoras do curso, trouxe a proposta debaixo do braço e foi a primeira coordenadora da graduação em Obstetrícia da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo. Os alunos começaram a chegar em 2005, alguns sem saber direito do que se tratava o curso. Mesmo assim, a primeira turma se formou, e com isso surgiram novos enfrentamentos políticos, que não cessavam em tentar fechar a graduação. Algumas pessoas achavam que a realidade tinha que nos aceitar, mas a realidade (a institucionalidade) não vai nos aceitar. Dulce se sentia com cada pé em uma canoa, sempre em situação de instabilidade, mas era e ainda é preciso conhecer cada canoa e pensar: como vou me equilibrar?. “Fui ativista a meu modo”.
NÁDIA ZANON NARCHI
Graduação em Enfermagem e Habilitação em Enfermagem Obstétrica pela Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (1977), Mestrado em Enfermagem Obstétrica e Neonatal pela Universidade de São Paulo (1994), Doutorado em Enfermagem pela Universidade Federal de São Paulo (1999), Livre Docência em Saúde Materna e Perinatal pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da Universidade de São Paulo (2011).Professor Permanente do Programa Interunidades de Doutorado em Enfermagem das Escolas de Enfermagem (São Paulo e Ribeirão Preto) da Universidade de São Paulo. Professora do Curso de Obstetrícia da EACH-USP e participante do grupo de pesquisa Sociedade, Cultura e o Processo Saúde Doença, nas linhas de pesquisa .Modelos terapêuticos, sistemas de cuidado e práticas em saúde e Mulher, saúde e cuidado. Tem experiência na área de Enfermagem e Enfermagem Obstétrica, com ênfase em Promoção da Saúde da Mulher e práticas de cuidao à Saúde Materna e Perinatal.
Na data da entrevista, com algumas contas de cabeça, Nadia se deu conta de que estava completando 46 anos de formada. Batalhou pela criação da graduação em Obstetrícia na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo. Atua no curso desde 2006. Em 2023, assumiu a aposentadoria e, na data do vídeo, estava completando 13 dias desde que se mudou para o interior (descansar se faz necessário). Uma trajetória gratificante a cada relato trazido por uma egressa de como tem sido a atuação, mas também uma trajetória muito difícil, pesada e desgastante. Ocupou a coordenação do curso, presenciou a formação das primeiras turmas, embates com o conselho profissional (COREN/COFEN), processos judiciais para garantia de um direito descrito em diversos aparatos legais para a prática profissional de obstetrizes no serviço de saúde. Presenciou a difamação pública e a perseguição da categoria pelo conselho que deveria fiscalizar o exercício profissional, bem como zelar pela qualidade dos serviços prestados pelos membros da classe e pelo cumprimento da Lei do Exercício Profissional. Como resultado da luta e resistência, o conselho se viu obrigado a fazer a inscrição dos portadores do diploma ou certificado de Obstetriz, a abster-se de restringir ou prejudicar a atividade profissional dos obstetrizes, a obrigação do Coren-SP de se retratar oficialmente do conteúdo veiculado em matéria pública e a condenação do Coren-SP ao pagamento de indenização a título de dano moral coletivo. Entre embates, inimizades e muitas vaias em espaços públicos por lutar pelo curso de Obstetrícia, “Você engole, porque você tem certeza daquilo que você está fazendo, você tem uma coisa chamada convicção.” Os entraves ainda persistem. Para lutar, principalmente em São Paulo, contra as Organizações Sociais de Saúde, algumas das quais abertamente se dizem contra as obstetrizes, como é o caso da OSS CEJAM, dentro do sistema de saúde médicocentrado, é preciso “acreditar que é possível fazer uma assistência diferente.”
BIANCA ALVES DE OLIVEIRA ZORZAM
Possui graduação em Obstetrícia pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (2008). É mestre e doutora em Ciências da Saúde pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. Linhas de pesquisa: direitos sexuais e reprodutivos, violência obstétrica, decolonialidade e gênero no âmbito da saúde materna. Atualmente é docente do curso de obstetrícia da EACH-USP e participa de pesquisa com a REHUNA- Rede de Humanização do Parto e Nascimento.
Resistente, afetiva e subversiva, hoje obstetriz e professora de futuras obstetrizes, Bianca, na época do vestibular, já havia prestado para medicina, e na USP, entre a Obstetrícia e a Geografia, escolheu percorrer caminhos até então desconhecidos para ela. No começo, não entendia muito bem a graduação em Obstetrícia. Soube que continuaria e se formaria quando, em 2005, viu e ouviu uma parteira mexicana e soube que “O mundo nasce ao ritmo do coração” (um vídeo-poema sobre a gravidez, o parto e o nascimento de Naolí Vinaver). Se formou na primeira turma. Era uma mistura de efervescência e medo com o “E depois, quando eu me formar? O conselho de enfermagem daria o registro profissional?”. Os enfrentamentos desde a graduação possibilitaram entender que a saúde é política e que “toda obstetriz faz um curso de militância também”. Se, por um lado, rolava uma angústia, por outro, rolava uma sensação de que a gente estava caminhando no caminho que precisava caminhar, o caminho da mudança dentro de um modelo de assistência, dentro de um contexto de violência contra as mulheres, altas taxas de cesárea. Na Casa Ângela, para ela, uma escola de obstetriz, morada da saudade que ainda guarda de lá, da liberdade, de um potencial criativo, de experimentação e construção coletiva, descobriu que, em árvores adubadas por placentas, não nascem apenas flores, frutas, nascem crianças também, nascem Romãs, renascem mulheres. Um sol gostoso de manhã testemunha o pulsar da ousadia de uma parteira que alimenta o desejo de querer o novo, de querer mudar as coisas. Uma Obstetrícia revolucionária, uma transformação que vai além da saúde, é crítica política com relação à vida. Que nenhuma mulher sangre mais do que precise sangrar. Sejamos ousadas.
MAYARA CRISTINA SILVA CUSTÓDIO
Acupunturista e Obstetriz formada na sexta turma da graduação em Obstetrícia pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo. Foi presidenta da AO-USP na gestão de 2017-2020. É mestre em ciências pela EACH-USP com pesquisa sobre narrativas e trajetórias do cuidado em saúde de mulheres negras. É membra do departamento de educação do Rehuna. Trabalhou em um hospital estadual em São Paulo durante 4 anos, e com partos domiciliares, e atualmente trabalha no Coletivo Nascer e de maneira autônoma com educação perinatal e medicina chinesa.
Nascida e criada na Zona Leste, Mayara viu a Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo sendo construída. Na época da escola, a graduação que chamava sua atenção era Psicologia, mas foi em uma comunidade do Orkut chamada “Obstetrícia EACH USP” que descobriu essa graduação. Entrou em 2010 na universidade e fez parte da sexta turma do curso de Obstetrícia. Demorou um pouco para entender a formação da obstetriz, não demorou muito para perceber que era uma das poucas pessoas negras em sua turma. Violência cortante e silenciada. Na época, na graduação, já se falava muito de gênero, pouco de raça. 2011 foi um “ano difícil para quem escolheu ser obstetriz”; o Relatório Melfi sugeria cortes de vagas em todos os cursos da EACH e a não oferta de vagas para Obstetrícia no vestibular de 2012. “Eu consigo lembrar da sensação até hoje, do que eu senti quando falaram que o curso ia fechar. Eu acreditava muito nessa formação, acreditava muito que as mulheres brasileiras precisam de obstetrizes.” A vida se fez e se refez entre um mestrado, a presidência da Associação de Alunos e Egressos do Curso de Obstetrícia da Universidade de São Paulo (AO-USP), partos domiciliares e hospitalares, risco jurídico, violência e muita insubordinação diante de um sistema obcecado por violentar corpos. “Estamos numa guerra de modelo de saúde ainda.” “As pessoas ainda não entendem o que é respeitar o corpo de uma pessoa.” Insubordinada, desobediente, é assim que chamam aquelas que pegam na mão de outras mulheres com a força de quem diz “vamo lá, vamo juntas.”
Links Úteis
Email e Endereço
Centro de Documentação: História e Memória da Obstetrícia.